O quinto painel do II Congresso Mundial sobre Sistemas de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta abordou as soluções e demandas dos sistemas ILPF do ponto de vista do produtor rural que já adotou a tecnologia.
O primeiro a contar sua experiência foi Antônio Pitangui de Salvo, de Minas Gerais, que trouxe a visão do pecuarista. Além de produtor rural, Toninho, como é conhecido no setor agropecuário, é agrônomo, presidente da Comissão Nacional de Bovinocultura de Corte da CNA, presidente da Câmara Setorial da Carne Bovina do MAPA, vice-presidente da FAEMG e presidente do Sindicato de Curvelo.
Sua fala ressaltou a premissa de que o futuro do agronegócio é utilizar, de forma inteligente, todos os recursos disponíveis e os sistemas de ILPF são um destes caminhos, garantindo a sustentabilidade. Suas fazendas ficam em Minas Gerais, em uma região de regime pluviométrico irregular, o que interfere diretamente na escolha dos cultivos a serem feitos.
Segundo o palestrante, uma das principais dificuldades do pecuarista é a tomada de decisão, especialmente quando se trata de sair de uma atividade de domínio, no caso a pecuária, e partir para uma diversificação com lavoura e, especialmente, árvores. Isso porque essa mudança de atividade exige investimento e adoção de tecnologias para obter sucesso. “É uma decisão que precisa ter maturidade”, analisa. “Eu fui muito ‘São Tomé’: enquanto não conheci propriedade com a ILPF já implantada, não implantei em minha propriedade. Mas, a partir do momento que conheci, implantei de imediato”, revela.
Além da escolha do componente de lavoura e de floresta adequados à região, as fazendas que administra apostaram também em genética de animais diferenciada. “Com isso, potencializamos a lucratividade do sistema tanto pra leite quanto carne”. As propriedades trabalham dentro do protocolo Carne Carbono Neutro (CCN), o que também traz benefícios na hora da comercialização. “Acreditamos nisso e, também, está em discussão a criação de uma genética carbono neutro, criada em ambiente totalmente sustentável”, explica.
Para Toninho, a adoção de sistemas ILPF tem diversas vantagens. A primeira é a sustentabilidade da produção com o selo CCN e a garantia do bem-estar animal. “Somos questionados internacionalmente por isso e posso afirmar que não há país melhor que o nosso em bem-estar animal. Alguns são até semelhantes, mas afirmo com tranquilidade que, nas condições brasileiras, em especial na ILPF, as condições para o rebanho bovino são espetaculares”, comemora.
Outro ponto ressaltado é a possibilidade de tranquilidade financeira com a diversificação de atividade: genética na bovinocultura, lavoura e madeira. “Temos opção de renda diferenciada”, avalia. Fato importante é que, na experiência do produtor, a partir do segundo ou terceiro ano de implantação, acontece a inversão da curva de investimento X retorno financeiro. “Está paga a conta da implantação do componente florestal e da recuperação do solo e pode-se continuar investindo na proteção e fertilidade do solo, na genética do gado, entre outros fatores”, finaliza.
Produção e pesquisa científica no mesmo espaço
O segundo palestrante do dia foi Abílio Pacheco, pesquisador da Embrapa Florestas e proprietário da Fazenda Boa Vereda, em Goiás, que trabalha com sistemas de integração há mais de dez anos e trouxe a experiência tanto de pesquisador quanto de produtor rural. “Acredito na ILPF como sistema inovador, com viés de sustentabilidade muito forte”, atesta.
Pacheco conta que a fazenda estava produzindo pouco, com baixa produtividade e contava com duas opções: arrendar para produção de cana de açúcar ou aprender mais sobre um novo sistema produtivo. A pergunta era: como mudar o sistema convencional para ILPF? A escolha foi por entender que poderia produzir mais, não só em produtividade do gado de corte, mas com diversificação de atividades e sustentabilidade.
Com a ILPF, a Boa Vereda saltou de 4 arrobas de boi/ha/ano para 18 arrobas, além de produzir 45 m3/ha de madeira ao ano também. Ao mostrar a escala de tempo do que foi feito para a fazenda chegar a essa produção, com o plantio de soja no começo, Pacheco também atestou que esse cultivo de grãos abateu os custos da implantação do sistema. “Além disso, este tempo com cultivo de grãos ajuda a preparar as árvores para a entrada dos animais, que acontece aproximadamente aos 18 meses depois da implantação do componente florestal. Após a soja, foi implantada pastagem na área e, hoje, a Fazenda produz proteína animal e madeira”.
Como pesquisador, Pacheco estudou e avaliou o melhor arranjo de árvores para as condições da Fazenda, que hoje trabalha com linhas simples. Desta forma, explica, é possível, por exemplo, retirar uma linha de árvores se quiser alternar com algum tipo de cultivo de grãos e, com isso, não ter problemas para preparo de solo, passar maquinário, etc.
Pacheco afirma que a sustentabilidade ambiental é um dos principais pontos positivos dos sistemas ILPF, mas que vários outros pontos são importantes, como conforto térmico animal, melhoria da pastagem, produção de matéria-prima para energia renovável com a madeira, entre outros. “A humanidade tem o desafio de produzir hoje, mas também garantir a produção de gerações futuras e a ILPF faz isso. Certamente está entre os sistemas do futuro”.
E completa: “a adoção da tecnologia é cara mas, sem dúvida, dá retorno. A produção de grãos no começo é capaz de pagar o custo de implantação do sistema”. O produtor ainda aconselha pequenos produtores a fazerem a seguinte prática: “adote em um pequeno espaço, invista em boa tecnologia: análise de solos, boas mudas, entre outros, e veja o resultado”. O pesquisador e produtor mostrou ainda resultados de pesquisas, visitas e o potencial de motivação quando os produtores conhecem e se inspiram durante a visitação ou assistem palestras.
Pacheco não deixou de abordar o componente humano em sua palestra. Além de se mostrar um entusiasta da tecnologia, falou sobre a importância dos recursos humanos: “Pessoas bem-humoradas trabalham bem”, ressaltou.
Um olhar além da técnica
O produtor rural Eduardo Riedel é formado em Ciência Biológicas e Mestre em Zootecnia. Atualmente, é Secretário de Infraestrutura do Mato Grosso do Sul e também administra, em conjunto com sua família, a Sapé Agropastoril, também no MS. Riedel refletiu sobre as oportunidades para o Brasil, como o aumento da demanda mundial por alimentos produzidos de forma sustentável.
Também apresentou números de projeções do MAPA de aumento de exportação de grãos e carnes nos próximos dez anos. “O Brasil é um dos poucos países capazes de apresentar uma resposta a esse desafio de demanda crescente por alimentos, de uma forma geral”. “Tudo isso, preservando a natureza”, ressalta, “fazendo uma agricultura de baixa emissão de carbono, sobretudo com sistemas ILPF”.
Para o palestrante, diversificar tem um componente cultural muito forte. A tomada de decisão envolve elementos como aspectos culturais, gestão de risco e o paradoxo entre “especialização x diversificação. Segundo Riedel, diversificar é mais desafiador, mas ajuda a diluir o risco da atividade. Além disso, o aspecto cultural de não querer mudar ou diversificar a atividade é uma barreira cada vez mais fácil de ser transposta, porque o acesso às informações, que é condição primordial para isso, está cada vez mais fácil. “Hoje também temos exemplos práticos e modelos a serem conhecidos para facilitar essa tomada de decisão”, avalia Riedel.
Do ponto de vista de organização geral, o produtor acredita que o aumento de complexidade não pode ser subdimensionado. “Absorver uma nova atividade faz com que a equipe de gestores tenha que lidar com essa complexidade”, observa. Cada elemento tem uma dinâmica de processo diferente e fazer isso sem perder a oportunidade de capturar a sinergia que possa existir entre essas atividades é um grande desafio.
Outro ponto é a gestão de custos quando existe mais de uma unidade de negócio dentro de um mesmo sistema produtivo. O gestor deve estar atento a questões de centros de custos, estoques, sazonalidade, entre outros itens de gestão. “Quem não mede, não gera. O risco de se perder na diversificação é grande. Por isso, é necessário um bom sistema administrativo para não se perder e, também, para medir o que você está conseguindo”.
“Outro ponto importante é trabalhar as pessoas e aqui está a chave do bom resultado da diversificação e um dos maiores desafios. São conhecimentos, culturas e paixões diferentes”, revela Riedel. Isso também implica em desafios sobre como definir a remuneração de cada perfil de funcionário, que estão juntos, mas trabalhando em diferentes níveis de complexidade.
Riedel finaliza ressaltando que, para se trabalhar com o agronegócio, é fundamental dialogar com as novas gerações. E os sistemas de integração permitem muito essa capacidade de inserir as novas gerações nesse processo: “aprenda, visite os exemplos, vá conhecer, não existe verdade absoluta, cada modelo é um modelo, cada família é diferente, cada empresa é uma empresa e cada uma tem que encontrar o seu caminho e suas oportunidades dentro desse mundo que é a diversificação e a integração entre as atividades”.
Foto: Divulgação Embrapa Florestas