O Brasil conta agora com uma forma de controle biológico para o percevejo-bronzeado, Thaumastocoris peregrinus, praga de origem australiana que causa prejuízos aos plantios de eucalipto. Esse percevejo está presente em todo o território brasileiro, causando problemas especialmente no Rio Grande do Sul, São Paulo e Minas Gerais.
Após oito anos de pesquisa, foi escolhido o parasitoide Clerucoides noackae, uma vespa de aproximadamente 0,5 mm de comprimento, como agente para uso em controle biológico clássico, que utiliza inimigos naturais da mesma região de origem da praga, oferecendo baixo risco ambiental. O principal desafio da pesquisa foi multiplicar o percevejo em laboratório, uma vez que o parasitoide precisa de seus ovos para se reproduzir.
“No entanto, devido à inexistência de técnicas para a criação da praga em laboratório, o desenvolvimento de uma metodologia viável tornou-se imprescindível”, explica Leonardo Barbosa, pesquisador da Embrapa Florestas e responsável pela pesquisa sobre criação massal do parasitoide. Para isso, diversos testes sobre a melhor forma de criar a praga foram realizados durante três anos. “Conduzimos estudos sobre bioecologia do percevejo, avaliando o efeito de diferentes espécies de eucaliptos e temperaturas no desenvolvimento da praga”, conta Barbosa.
A partir disso, foi definida uma técnica de criação da praga que, consequentemente, possibilitou a multiplicação do parasitoide. “Na metodologia proposta, os percevejos são mantidos em laboratório em temperatura e umidade controladas, e alimentados com ramos de eucalipto arranjados em forma de buquê preso em frasco com água. Os ovos de T. peregrinus são obtidos em tiras de papel toalha colocadas sobre os buquês de eucalipto e posteriormente utilizados para criação de C. noackae”, explica o pesquisador.
O parasitoide C. noackae se desenvolve de ovo a adulto dentro do ovo do percevejo, alimentando-se de seu conteúdo. Seu ciclo completo dura entre 15 e 17 dias, e logo após a emergência do inseto, as fêmeas são copuladas e saem em busca de novas posturas do percevejo-bronzeado para colocar seus ovos.
A criação da vespa começou na Embrapa Florestas em 2013 e as liberações têm ocorrido para fins de pesquisa, uma vez que ainda não há registro para utilização comercial no Brasil. Os parasitoides já foram liberados em plantios de eucalipto em Minas Gerais, São Paulo, Goiás, Maranhão, Tocantins, Bahia, Espírito Santo, Paraná, Rio Grande do Sul e até mesmo no Uruguai.
Os produtores também são incentivados a monitorar a presença do percevejo-bronzeado em suas plantações, para tentar identificar sua presença antes que os danos sejam mais severos. O monitoramento da praga é feito com armadilhas adesivas amarelas colocadas no tronco de árvores. As armadilhas devem ser retiradas aproximadamente 30 dias após a identificação da praga.
A introdução de C. noackae no Brasil ocorreu em 2012 por meio do Programa Cooperativo sobre Proteção Florestal (Protef), coordenado pelo Instituto de Pesquisas e Estudos Florestais (Ipef), com a participação da Faculdade de Ciências Agronômicas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), em Botucatu (SP), Embrapa e empresas do setor florestal.
O coordenador do Protef, Luís Renato Junqueira, explica que o desenvolvimento e o aperfeiçoamento do programa de controle biológico para o percevejo-bronzeado foi um desafio: “No cenário atual, o Brasil se destaca como benchmarking para o controle biológico dessa praga frente a outros países com importante representatividade florestal, como África do Sul, Argentina, Uruguai, Portugal e Espanha. Esse importante feito é resultado da integração entre universidades, centros de pesquisa e empresas florestais brasileiras, que dedicaram tempo, esforços e recursos”.
Prejuízos ao setor florestal
O percevejo-bronzeado foi introduzido no Brasil em 2008, atingindo plantios de eucalipto, gênero arbóreo mais plantado no País, responsável pelo abastecimento de indústrias de papel e celulose, energia, movelaria, entre outros. As perdas em produtividade devido ao ataque da praga variam dependendo da região, da espécie cultivada e da idade do plantio. Estudos recentes apontaram uma perda média de 14% na produção de madeira após um pico de ataque dessa praga em florestas com três anos de idade. Estimativas de produtores florestais apontam que, somente no Estado de São Paulo, entre 2010 e 2014, o prejuízo causado pelo ataque da praga tenha sido próximo a R$ 280 milhões, considerando-se apenas perdas diretas em incremento anual de madeira e produção final.
Os plantios afetados apresentam sintomas de prateamento, amarelecimento ou bronzeamento das folhas, seguidos de desfolhamento total das árvores, que, além de aumentar o risco de incêndios florestais, pode matar as árvores. Em alguns locais, a infestação do inseto atinge níveis elevados e chega a causar transtornos às comunidades vizinhas aos plantios, uma vez que os insetos podem chegar a residências e espaços públicos.
O setor florestal brasileiro de árvores plantadas tem grande importância econômica e socioambiental. Segundo a Indústria Brasileira de Árvores (Ibá), o setor, com uma área de 7,8 milhões de hectares, é responsável por 91% de toda a madeira produzida para fins industriais no País, além de contribuir para conservação, preservação e recuperação de ambientes naturais. Em 2015, estima-se que 5,6 milhões de hectares foram destinados à conservação e outros 45 mil hectares de áreas degradadas foram recuperados. Os plantios de eucalipto representam 72% da área total de árvores plantadas e apresentaram um crescimento médio anual de 2,8% nos últimos cinco anos.
Fonte: Katia Pichelli – Embrapa Florestas